Acordei com a lembrança falsa de favores amorosos prestados por uma velha amiga. Não me sentia, entretanto, enganado pela memória. Apenas perscrutava o fluxo de imagens confusas, como se a noite anterior tivesse passado imersa em álcool e brilhantismo. Moças sorrindo, desconhecidos olhando torto para mim, a nave secular da soberba humana pairando sobre nossas cabeças, num revanchismo retórico. A cidade fora dos pátios gradeados repartia-se em duas; aludindo à figura mítica da hidra. Em pouco tempo, sombras tomaram o lugar de tudo o que via, até restar, no dia seguinte, meu rosto cansado, frágil pelas certezas ausentes. Quem estava lá, afinal? Somente um rosto recorria aos esforços contra a amnésia temporal, um rosto familiar, inclusive aos apelos de afago passageiro. Mais uma história que não terminou na minha vida, deixada em aberto para um futuro talvez. Ela me resguardou do desgaste que a noite impôs aos que avançaram contra si mesmos? Era constrangedor perguntar. Mais: era intimidador. Como não podia sublinhar de minha demência etílica, fiquei divagando, ainda deitado. Uma larga hora se passou. A manhã ia alta, e eu entregue ao que pude ter feito, ao que não pude fazer, elementar na hipótese sensual.
[Texto escrito em 14 de outubro de 2007]
[Texto escrito em 14 de outubro de 2007]
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